Existem muitas mensagens
motivacionais com a promessa de mudar a sua vida a partir daquele instante. Se
isso é verdade, por que será que elas continuam sendo procuradas, geralmente
pelas mesmas pessoas? Não bastaria lermos um texto transformador e começarmos a
agir diferente a partir daí?
Eu acho que não é isso o
que acontece. As pessoas são lembradas e relembradas da importância de promover
mudanças na própria vida e mesmo assim raramente essas mudanças são
implementadas. Sei que cada um tem um estilo diferente, mas na esperança de
ajudar uma parte de quem me lê, compartilho o que funciona para mim.
Eu sou uma pessoa que
funciona bem com rotinas, planos e sistemas. Para mim, um dia bem aproveitado é
fruto da incorporação de bons hábitos, o que gosto de fazer pouco a pouco. Não
faz muito tempo, em uma aula de francês, começamos a discutir sobre ecologia.
Como era de se esperar, houve grande concordância sobre a importância de
preservar o planeta. Mas quando o foco passou a ser os hábitos de cada um, não
foi difícil perceber que essa importância mora no nível do discurso e passeia
de vez em quando pela prática.
No discurso eu não me
considerei uma pessoa muito ecológica, porque conheço quem seja bem mais do que
eu. Na hora dos exemplos, meus hábitos impressionaram os colegas. Não uso carro
há cerca de quatro anos, faço minhas compras em mercados próximos de casa, dou preferência
a produtos locais, separo todo o lixo para reciclagem, levo minha própria
sacola ao mercado e outras coisinhas mais.
Colocando assim parece
muito, e isso só no que tange à ecologia. Se entrar em temas como línguas ou
desenvolvimento profissional vai muita linha pra contar metade da história. Bem,
depois da aula o professor, também surpreso, me perguntou qual era o segredo. O
meu é mudar meus hábitos aos poucos. Não foi um texto motivacional que mudou a
minha vida de um dia para o outro. Adotei uma coisa por vez, até porque em
geral elas pedem um tempo de adaptação.
Um dia adotei o hábito
de colocar uma sacola na bolsa, assim não precisaria mais pedir saquinhos no
mercado. Parece bobo, mas eu demorei a me adaptar até a isso. Às vezes guardava
as compras e esquecia de colocar a sacola de volta na bolsa; às vezes escolhia
uma sacola ruim, que ocupava muito espaço e atrapalhava tudo; outras vezes
levava menos do que o necessário pra carregar o que eu precisava comprar. Com o
tempo achei a minha medida, e quando a coisa passa a fazer parte do seu modo de
vida, não é mais um sacrifício.
Separar material
reciclável deu trabalho também. Quando fui morar com o meu marido, ele colocava
na mochila, percorria metrô, ônibus e um caminho a pé para levar até a lixeira
perto do trabalho, que era a única que ele conhecia. Isso fazia com que, às
vezes, desse desânimo pra continuar levando. Pesquisei no site da prefeitura
onde tinha coletas de recicláveis e descobri, surpresa, que a nossa rua era uma
rota da coleta seletiva. Só que como ninguém no condomínio colocava reciclável
na lixeira, o caminhão tinha deixado de parar ali.
Conversei com a
administração do condomínio sobre os dias em que a coleta seletiva passava e
recomendei avisar os vizinhos. No início teve resistência: “Ah, as pessoas não
ligam pra isso. Elas vão começar a colocar em dia errado, vai dar confusão.”
Insisti. Liguei pra prefeitura e falei que o caminhão podia parar ali porque ia
começar a ter coisa pra recolher. Comecei a levar o meu reciclável no dia em
que o caminhão passava. Fui xingada por uma vizinha, que achou que eu estava
colocando lixo comum no dia errado. Expliquei que não, que esse era o dia da
coleta seletiva e que eu só estava colocando material reciclável. Ouvi mais
xingamentos depois disso, mas continuei. Falamos na reunião de condomínio.
Alguns anos depois, não cabe mais material reciclável nas lixeiras, e o caminhão
para ali sempre, porque todo mundo está fazendo isso.
Deu trabalho? Um pouco.
Mas eu escolhi dedicar um pouco da minha vida a fazer algo de que eu me
orgulhe. Quando se escolhe uma coisa para dar atenção até virar um hábito, é
possível. Uma vez incorporado, ele abre caminho a outros, e quando você vê,
está surpreendendo quem faz discursos sobre a sua prática.