26/11/2011

E quem fiscaliza o fiscal?

A nota fiscal paulista surgiu como uma possibilidade do cidadão ajudar o governo a fiscalizar as empresas, obtendo com isso uma pequena parte nos impostos toda vez que solicita o CPF na nota fiscal. Mais que isso, se propõe publicamente a ressarcir os cidadão caso ele identifique, reclame e registre denúncia contra empresas que não registraram o seu CPF com a Receita Federal. Um preço justo para aqueles que guardam as notas, acompanham, seguem os prazos descritos em manuais e acreditam na seriedade da proposta. Certo?

Seria, se a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo cumprisse a sua parte. Com diversas denúncias feitas, algumas há mais de 6 meses (muito além do prazo prometido de ressarcimento), a única resposta que tenho de cada órgão que aciono a respeito é, resumidamente, "procure outro pra reclamar". Sim, aqueles que investem maçicamente para que os cidadãos e as empresas façam sua parte nos pagamentos devidos, não pagam devidamente. Aqueles que fiscalizam o cumprimento da lei, esquivam-se de questões quanto ao cumprimento dos próprios compromissos, dentro de um programa que prega justamente isso: responsabilidade.

Vergonha. Só o que tenho a dizer. Nota Fiscal Paulista tem se mostrado, pra mim, programa pra inglês ver, com um troco pra quem acredita.

03/09/2011

O lobo voador



Em uma cidade do interior havia um povo que acreditava em um lobo voador. Passava de geração a geração a história de que o lobo havia sido visto voando durante a noite por entre os galinheiros para escolher presas para o seu jantar.
Recentemente os galinheiros eram mais protegidos e não permitiriam tais assaltos noturnos, no entanto, por respeito aos mais velhos e confiança no que diziam, os cidadãos ainda tomavam precauções contra o lobo voador.
Entre essas precauções estavam alguns pequenos hábitos e regras de comportamento, como não passear sozinho à noite, não deixar comida perto dos galinheiros e nem promover caças a lobos.
Conforme os anos passaram, pessoas escreveram sobre as exigências do lobo voador, com base no que seus antepassados disseram, para que as próximas gerações tivessem cuidado com o que fizessem. Quem contrariasse as recomendações e conseguisse manter suas galinhas ilesas teria que compensar a atitude com uma outra série de regras, sob o risco de que o lobo não mais fizesse concessões.
E assim passaram décadas e mais de centenas de anos de uma sociedade construída sobre o medo, mesmo que ninguém mais tivesse conhecimento do lobo voador. Qualquer um que questionasse a sua existência, no entanto, era identificado como ameaça à ordem da sociedade, já que punha em risco tudo o que havia sido construído até então: pessoas dentro de casa depois das nove da noite, horário de refeições para as galinhas e uma bela manada de lobos selvagens nos arredores, protegendo a cidade de - quem sabe - animais mais perigosos.
Um líder local dispôs-se a dedicar a própria vida em função da proteção contra o lobo voador, e criou um imposto para garantir a sua sobrevivência e a de demais protetores da cidade. Convencionou-se, a partir de congressos realizados com esses impostos, que não era tão essencial, mais, a existência real do lobo. O que importava era que as pessoas o tivessem em mente, para nunca saírem de casa depois das oito e que aqueles que alimentassem suas galinhas à noite teriam que pagar impostos extras, para que os protetores pudessem empenhar-se mais nas precauções.
Com o tempo, cada cidadão tinha uma cópia das regras de proteção em casa. É verdade que era raro que as lessem, afinal, os protetores se dispunham a lembrá-las com bastante frequência, a fazer teatros, shows e qualquer artifício de entretenimento para mantê-las na cabeça das pessoas (assegurada, é claro, por um adicional nos impostos).
Também estavam disponíveis mensagens novas e adornos para a casa e para o corpo com os dizeres "lembremo-nos do lobo voador" e "honremos o lobo voador".
No entanto, com o avanço da ciência, estudiosos locais identificaram algo diferente: um fenômeno noturno provocado pelas sombras das árvores e pelo reflexo de uma lagoa distante davam a quem se encontrava perto dos antigos galinheiros, a clara imagem de um lobo voador aterrorizante. Tudo o que havia sido construído e que acreditava-se constituir o caráter dos moradores mostrou-se reflexo da pura falta de conhecimento.
Nesse momento, entretanto, ninguém mais tolevara quem não acreditasse no lobo voador. Alguns encararam a notícia como conspiração. Outros como a confirmação de que o lobo os sondava (um sinal). Outros se uniram aos autodeclarados protetores para ensinar o povo que a nobreza do lobo voador não pode ser alcançada por meros estudiosos; que uma coisa não interfere na outra; que o lobo voador está além da nossa capacidade de compreensão científica.
Ainda existem descrentes. Mas a maioria da população tem medo.

08/05/2011

Razões e emoções

Tem emoções que precisam ficar no forno antes de sair a público, pois o forno permite que acalmem-se os ódios e você perceba o que não vale a pena ser dito.

Mas às vezes, temos que tomar atitudes rápidas, escolher em momentos de emoção. Nesses momentos, a razão parece ser o inimigo do nosso próprio ser, porque o ser em questão está tomado por irracionalidade.

Mas como perceber o que nos afeta a esse ponto? E como prevenir esses escorregões?

Será possível simplesmente respirar fundo e dizer a si mesmo "estou sendo irracional", "isso não deveria ter tanta importância?" ou "de fato, isso afeta meus valores"?

09/04/2011

Jogo de encaixe

Vez ou outra as pessoas tentam nos colocar em caixinhas, afirmando que "mulher é isso", "paulista é aquilo", "virginiano é coisa e tal".

Não entendo o porquê desse anseio em definir-se de fora, a partir de grupos, como se todos devêssemos corresponder a todos os traços de todos os grupos de que fazemos parte!

Qual é a grande crise, afinal, em reconhecer que cada pessoa é um conjunto único de traços que ora coincidem e ora se opõem aos de outros seres humanos?

15/01/2011

Involuída

Minha consciência não dá conta do turbilhão de informações trazidas pelos sentidos.

Eu, ser incompleto, acabo brinquedo do inconsciente, no que lhe atinge despercebido

e passo a vida à mercê de falhas de sistema,

de confusõe

s entr

e o quê é o quê e qual deles faz algum sentido;

vivo uma vida de b

icho involuído,

ancestral de um

a raça sensível,

que vai, talvez, presci

ndir desse inconsciente e dessas palavras difíceis só pra tentar apreender o que fugiu do desenho formado pelo turbilhão de informações inapreensíveis.

Cortinas

Não havia me dado conta do quanto poderia crescer.

Só sacudida de uma experiência a outra as cortinas foram se abrindo, muito lentamente.

O tamanho delas é o maior mistério, ainda.

Ao pregar a humildade, me ensinaram a admitir que a cortina é grande, talvez infinita, que nunca paramos de aprender. Mas esse "grande" não é visível.

Posso admitir que ainda há muito a evoluir por conclusão lógica, sem contudo me dar conta disso, como quem observa uma conta de soma e aceita como verdadeira, sem saber se duas maçãs mais quatro peras resultarão em seis frutas.

Admitir não é perceber. É somente com as experiências, somente com a percepção do quão infantil era ontem que consigo me surpreender com o quanto tinha que mudar e não sabia; com o quanto meu orgulho não me deixaria perceber que o que eu era provocaria fracassos doídos, caminhos perdidos e tempo despendido olhando para o lado errado.

Estava errada e não sabia. Estava verde, diria. E por mais que o perceba, e que seja tentador transpor essa percepção ao presente, não consigo.

Simplesmente porque não posso dizer o que será de mim amanhã.

Simplesmente porque não posso evoluir agora por experiências que ainda não vivi; assim como uma pessoa não pode apaixonar-se por quem não conheceu ainda.

Resta o apreço pelo que há por vir, pelas cicatrizes que abrirão caminho para a pele mais firme; para os carinhos que desatarão as amarras mais sem sentido.

Resta respeitar quem fui, com seus defeitos que certamente determinaram o caminho seguido; com suas qualidades também - essas, convenientemente associadas a uma imagem tolerável de mim.Orgulho de fresta visível.

Resta analisar, sempre que possível, o que poderia ter sido, à luz dos conhecimentos adquiridos, e mais ainda, o que pode ser.

E resta ser grata, especialmente pelas pessoas do caminho, que são senão as únicas, as mais importantes partes disso.