Publica-te e liberta-te do
mundo tortuoso dos que se entregam ao que escrevem sem dar a mínima ao que quer
que isso represente, deixando as palavras fluírem vagarosas, vigorosas como
quando nasceram. Pareciam gritar antes de serem paridas, atormentar antes de
serem organizadas no papel e se transformarem finalmente em um monte de
palavras que agora parecem tão comuns.
Deixe que saiam correndo
peladas, sem a vergonha que lhe colocam as pessoas com seus tapas de crítica
afiada no amolador das experiências e opiniões particulares.
De que vale abandonar o
mundo dramático em que reconheces a si mesmo em prol de uma tranquilidade
mórbida, em que não se perca nem nada se ganhe, mas fica só tentando
identificar um caco de passado angustiante entre espelhos perfeitos e falsos, feitos
para exposição?
Publica-te e arrisca perder
contato com o submundo dos poetas que teimam em serem eles mesmos a despeito da
publicidade bem comportada e com contrato assinado. Põe na rua o teu drama, que
por mais infantil que seja, quando publicado é a chave que abre a corrente de
sentimentos e pensamentos que jorram sobre papel ou qualquer meio capaz de
absorver palavras rebeladas contra as boas normas do que vai ser lido por seus
críticos mais sem paixão.
Terás sim que podar as arestas
no limite da sua coragem de autoexposição. Terás que limpar o sangue escorrido
ao redor da obra, longe da vista dos passantes. Mas isso nunca vai te impedir
de sangrar de novo, de sentir de novo genuinamente a emoção dos escritores
descomprometidos com o público. Se abrires mão do público, no entanto, saberás
sempre metade da história. A metade que mais aparenta dor, mas que é a mais
acomodada; a que parece guardar tesouros, mas nunca foi avaliada. Arrisca-te a
ser ridicularizado e desfaz algumas fantasias que podem estar te prendendo em
um mundo de autoimolação.
Mas nunca esqueça, depois
de sair a público, de voltar de vez em quando a jogar-se ao vento em letras
perdidas, em pensamentos. Só assim as conexões com outros pensamentos bastardos
se fazem poderosas. Só assim nos arremessa de novo ao fundo de que sentimos
querer sair sem deixar de admirar a beleza.